ranzinza

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terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Roupas


Como a máscara dos que dormem de máscara
E na manhã seguinte descobrem que nunca mais a desgrudarão do rosto
As roupas são o tecido tênue que divide o homem e o mundo
O real e o fantástico
Então não se esqueçam que de tão pegadas ao corpo
As roupas confundem-se com nós
Mas são só coisas
As roupas são a pele da ética
Elas são o limite entre o homem em paz e o mundo cão
A coisa limítrofe entre duas verdades
As roupas são o sinal mais luminoso que diz que o homem precisa da ficção
As roupas são a primeira escolha diária de cada homem
E também a primeira expressão
As roupas são a dica de que não há como fugir das abstrações
As roupas são de alguma forma a natureza de todas as loucuras
As roupas podem gritar mais do que muitos quadros
Elas apontam o dedo em tom de inquisição
Seja pra quem as veste ou as repara
As roupas confeccionam ideias absurdas
E afirmam como verdade todo absurdo
São a origem das fofocas?
As roupas são o fio fino e transparente que junta e divide a verdade da mentira
Como o rio negro que se encontra  e se divide de outro rio
As roupas protegem da lama
Outras roupas protegem do sangue do paciente
Outras roupas identificam o garçom
Esse tipo de roupa divide a gente toda do mundo como pedaços uniformes de uma pizza
Os outros tipos de roupa podem autenticar indivíduos
Mas estas também muito facilmente se tornam cópias das cópias das cópias
E logo a pizza vira uma bagunça uniforme mais uma vez
Onde estão todos sendo woompa loompas achando que são Srs. Wonka
 As roupas são a extensão sem fronteiras do homem
As roupas são o reflexo que o homem precisa criar de si mesmo
Para que constitua sua identidade
As roupas são o próprio personagem do homem e não o seu figurino
As roupas talvez sejam bloqueadoras de sonhos e ferramentas dos pesadelos
Mas são sem dúvida o porquê do tesão
E da riqueza da indústria pornô
As roupas desenham o mundo
Mas quem as desenha só desenha cifras de bucks
A eletricidade das multidões têm livre arbítrio e poder
Poder de um sobre o outro e do outro sobre um
E ninguém das multidões percebe as passarelas das Fashion Weeks
Cada um de todos os homens do mundo quer existir para cada um de todos os homens do mundo
E por isso gasta o dinheiro do seu trabalho em roupas plurais
E sai com elas de casa para o universo
E se o homem não quer mais escolher suas roupas ele já morreu
E sabe disso
E se o homem julga outro homem como gay por escolher bem sua roupa
Esse homem é brasileiro
E se no Brasil um homem escolher muito bem sua roupa ele é gay
E se na França um homem não escolher bem sua roupa ninguém fala com ele
Isso eu inventei
Há passagens na bíblia sobre as roupas do céu ou do inferno?
O Chico Xavier falou algo?
As roupas são a maior gaiola terrestre
As roupas são a grande chave social
Há maldade maior do que ensinar aos índios o que é pecado?
Jogaram-lhes roupas na cara e borraram suas pinturas
As roupas transformam qualquer homem em tudo o que ele quiser ser além dele mesmo
E ele pode ser tudo o que quiser desde que as compre
Ou tenha o direito de as usar
Como um padre ou um juiz
De futebol
Mas assim as roupas também ensinam aos sábios
Que somos apenas uma coisa
E por meio delas estamos o quanto desejarmos
Veja
Um homem pode estar padre desde que vista a batina
Pois amanhã pode estar juiz desde que carregue um apito e cartões
Mas se as roupas caíssem deste homem para sempre?
Ele estaria condenado a ser
Mas o fato é que as roupas caem e sobem
No corpo ou no Cabide
Abrem e se amarram
Por trás ou pela frente
Há ainda os ridículos que colocam roupas em seus cachorros
Haja perversão!
Mas as roupas sempre estarão dizendo em silêncio tudo o que precisa ser dito
Nada
E ao dizerem isso dizem o essencial
Sejamos livres.