O mundo acabou e ele
caminha pelo deserto desviando de esqueletos. As vezes não há como evitar a
reflexão diante do abandono que aquelas caveiras sorridentes inculcam na
memória, o tempo é uma camisa de força que desmancha tudo a cada passo e o que
fica para trás desaparece, o peito é pequeno demais para caber no universo.
Sob o chilro quase
mudo de cobras de areia que se formam com o vento a poeira desenha formas nas
pedras e por mais que exista um horizonte quanto mais você caminha ele nunca se
aproxima, você está sempre no centro do deserto. Não há maturidade que console
um coração que se dilacera por tais condições, falta argumentos na solidão de
tudo o que poderia ter sido mas falhou de maneira tão frágil.
Ele caminha porque
existe um resto de eletricidade débil que sobrevive no seu cérebro mesmo
sabendo que a morte é a verdade absoluta, a cova é a verdade do universo e
qualquer ideia de sentido diante da vida é só brincadeira fúnebre.
Você talvez more em
um cidade bem populosa, mas também não há nada lá onde você está indo espacial e
temporalmente: não há nada na sua velhice e não há nada na casa que você sonha
em comprar. O homem no deserto tem consciência disso porque ele está mais perto
da verdade que você, que vive distraído pela tecnologia e pelas relações
teatrais que admite, a tua forma de olhar pra frente é perversa.
Você é o homem no
deserto, é só abrir os olhos.
Você é violento
porque vive a alucinação de ter que tomar banho quente todos os dias mas de olhos
abertos você seria filosófico e sujo, descobrindo que faz parte das filas de
eternos bebês flutuando para lugar nenhum à mercê de explosões e dores, e que o
destino é sarcástico por isso as caveiras sorriem. Um homem está cortando a
grama do outro lado da rua agora, não nos resta nada de verdadeiro que não
esteja de mãos dadas com a morte. Sem pensar em nada disso o homem no deserto
as vezes cava fundo em busca de um pouco de água suja, e você vive no mundo do
conhecimento sem saber que nada apodrece mais a carne do que a água, e lava o
rosto nas águas sagradas da pia, nada como um dia após o outro dia. Mas é você
o homem no deserto, confuso pelo concreto e pelo aço, que deveria perceber que
os dias e as noites são uma coisa só, afinal, tudo muda de significado para nós
que somos resultado de uma natureza sem princípios e as mesmas constelações que
levavam homens longe pelo mar e pelo deserto hoje representam pouco.
As constelações são
grandes mentiras por apontarem direções aos homens, como um prato de comida
quente para um mendigo em um mundo de abandono. Buracos não existem e buracos são o sentido
final da vida.
Se você lutar contra
esse longo sono REM e conseguir permanecer em estado de vigília vai ver a
verdade do que estou escrevendo.
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