ranzinza

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segunda-feira, 31 de março de 2014

2 Joyces

"I will not serve that in which I no longer believe, whether it call itself my home, my fatherland or my church: and I will try to express myself in some mode of life or art as freely as I can and as wholly as I can, using for my defence the only arms I allow myself to use -- silence, exile, and cunning."
-from A PORTRAIT OF THE ARTIST AS A YOUNG MAN


Mais ou menos uma tradução:

"Eu não servirei o que eu não acredito mais, mesmo que isso se chame de minha casa, minha terra pátria ou minha igreja: e eu vou tentar me expressar em algum modo de vida ou arte tão livremente o quanto eu puder e tão completamente o quanto eu puder, usando em minha defesa  as únicas armas que eu mesmo me permitir usar - silêncio, exílio, e astúcia"

Do "RETRATO DO ARTISTA QUANDO JOVEM"  

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"It is as painful perhaps to be awakened from a vision as to be born." 

"Ser acordado de uma visão talvez seja tão doloroso quanto nascer"  
                  Ulysses



terça-feira, 18 de março de 2014

"Ser um turista massificado, para mim, é se tornar um puro americano contemporâneo: alheio, ignorante, ávido por algo que nunca poderá ter, frustrado de um modo que nunca poderá admitir. É macular, através de pura ontologia, a própria imaculabilidade que se foi experimentar. É se impor sobre lugares que, em todas as formas não econômicas, seriam melhores e mais verdadeiros sem a sua presença. É confrontar, em filas e engarrafamentos, transação após transação, uma dimensão de si mesmo tão inescapável quanto dolorosa: na condição de turista você se torna economicamente significativo mas existencialmente detestável, um inseto sobre uma coisa morta". 

(David Foster Wallace)

segunda-feira, 10 de março de 2014

"Por que laranja se chama laranja e limão não se chama verde?"





Outro dia trombei por aí com a pergunta "se laranja se chama laranja por que o limão não se chama verde?". Me pus a pensar.

Sempre desconfiei que questões linguísticas tendem a colocar ordem no caos, uma vez que o caos é toda ordem que não compreendemos e toda ordem é o caos que dominamos.

(Com o tempo as ordens se transformam e nós perdemos os sentidos básicos da vida - como a origem da palavra 'salário': a partir dela podemos ter esclarecimentos homéricos de economia, política, sociologia e até religião, uma vez que esses temas são tão difusos e ficaram tão rebuscados a ponto de muita gente não saber patavinas a respeito, como se já não houvesse um foco, justamente porque nossa memória coletiva [nossa crença na história] se torna uma espécie de queijo suíço, cheia de falhas, cheia de coisas que não nos disseram e que são básicas, nos faltam para entender o mundo como está neste instante. Por isso buscar algumas etimologias é sempre enriquecedor por ser esclarecedor.)

O fato é que pensando a respeito da pergunta, eu tive uma epifania, acabei conectando pontos dentro das minhas ideias e mais uma vez na vida aprendi, criei(?), uma coisa sozinho. O Posto levava o nome do André Abujamra, como autor da pergunta, acho ele extravagante e então comentei:

 'Porque a cor na verdade se chama 'alaranjado', uma vez que é ela que leva o nome da fruta e não a fruta que leva o nome da cor. Sendo o alaranjado um dos tons da cor vermelha, ela precisa de um objeto universal de referencia, que nesse caso é a laranja. Como o cor-de-rosa, que é também um tom de vermelho e tem a flor como referencia. Curioso é que em alguma língua africana - não me recordo qual - não existem referencias para algumas variações de cor, por isso o amarelo, o alaranjado e o vermelho, são representados pela mesma palavra. Já o limão não é referência para o verde, que é uma cor primária assim como o vermelho e o azul, por isso tem um nome próprio. Embora, possivelmente, essa não seja a verdadeira pergunta do Abujamra.'

Depois ainda fui descobrir, pesquisando, que 'amarelo' é uma variação do latim amarus, que significa amargo, porque essa era a cor da bílis quando oxidava e diz-se que seu sabor é terrivelmente amargo. Portanto para aquela cor, ficou seu sabor característico.

Amém


sábado, 22 de fevereiro de 2014

O tempo é dinheiro no mundo dos relógios


Os relógios que até hoje levam a marca Quartz, são assim chamados desde 1927, quando os estadunidenses Warren Marrison e J.W. Horton criaram o relógio de quartzo, material que cria um sinal com uma freqüência mais precisa que os relógios mecânicos produzidos até então. Logo a marca se expandiu e a industria dos relógios – despertadores, relógios de pulso e relógios de parede - foi dominada pela marca.  

Como é razoável que aconteça com qualquer marca em ascensão, a Quartz alcançou os principais mercados para além dos Estados Unidos, implantou novas estruturas para produção em vários países estrangeiros, o que a permitiria entrar no comércio destes países de maneira combativa – não precisando arcar com taxas de importação e exportação –, o que permitiu também que houvessem lojas específicas da Quartz em todo lugar, sem a necessidade de recorrer a joalherias independentes para vender seus relógios.

Essa ascensão da Quartz foi explosiva e logo a sua força era tamanha que os acordos mais variados eram possíveis à marca, que se tornou alvo de interesses dos maiores empresários da maioria dos países em que atuava. Contatos com grandes políticos também começaram a acontecer.

Em 1930 o negócio de relógios decaía e a Quartz, na contramão, iniciava seu crescimento por começar a produzir e vender no mercado brasileiro, um dos primeiros mercados de interesse da marca fora da América do norte, que logo foi procurada por Pardal Antunes Mirella, um parlamentar carioca que propôs à marca algo de uma lisura digna do filme “Acabaram-se os Otários”: uma parceria para a implantação do horário de verão.

Pardal Antunes Mirella escreveria o projeto “Horário de verão” para ser votado no senado, sob o pretexto de “economia de energia elétrica e maior aproveitamento do dia na época do verão”, de forma que os relógios fossem adiantados em uma hora na entrada da estação, e ao fim dela tivessem que ser retrocedidos em uma hora.

A peça chave dessa maracutaia é segredo para todos: os relógios mecânicos todos são produzidos para funcionar apenas no sentido horário, o seu sistema delicado de engrenagens, cordas, parafusos e ponteiros, desestrutura-se caso o relógio seja trabalhado no sentido contrário – sentido anti horário -, o que fez que com o fim do horário de verão, sem informação a respeito do funcionamento dos seus relógios, quase toda a população brasileira voltasse o ponteiro dos seus relógios para uma hora atrás e nos dias seguintes seus relógios parassem de funcionar, o que teve como resultado um crescimento de mais de 200% nas vendas da Quartz no Brasil, nos meses seguintes à implantação do horário de verão anualmente. Desses 200% dos lucros da empresa nesta jogada, 40% eram destinados ao saldo bancário de Pardal Antunes Mirella, como parte do acordo.

Isso era meados de 1931 e foi a grande jogada da história da Quartz, que ano após ano lucrava imensamente com o fim do horário de verão, enquanto a concorrência se desfazia, de onde surgiram os lucros que permitiram à marca se expandir para a Europa.

Como nem tudo são confetes no mundo cão liberal, e porcos chafurdam nos diamantes do porão dos clubes de sinuca dos bacanas, o Brasil sofreu seu primeiro golpe de estado em 1937 e o Sr. Pardal acabou assassinado na surdina pela sua oposição, o partido de Getúlio Vargas, partido comunista, e com isso o horário de verão logo deixou de ser adotado, embora durante os anos da Era Vargas ainda tenha acontecido por algumas vezes esporádicas, afinal, havia uma determinada economia na energia elétrica nos meses desse horário alternativo, mas desta vez sem acordo nenhum com empresários.


Depois de todos os tramites históricos que deram fim à ditadura militar no Brasil - e não nos competem neste texto - em 1985, Tancredo Neves foi eleito presidente da nação, porém morreu misteriosamente antes da sua posse, e a presidência ficou com José Sarney, que entre outras medidas, ainda naquele ano, reestabeleceu de maneira concreta o horário de verão, assim beneficiando, a agora consolidada, marca Quartz e conseguindo uma fonte preciosa de renda pessoal, que o permite até hoje ser fotografado em Acapulco. 

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Uma ideia perigosa.


Algumas pessoas tem andado por aí um pouco decepcionadas com o mundo conforme as suas noções das coisas vão se transformando, e são submetidas a uma televisão que sensacionaliza as mortes na Ucrânia, a violência na Venezuela e repete incansavelmente termos como "vândalos", "vandalismo", "violência", "destruição e "crime" quando o assunto é os manifestantes brasileiros.

Acho que essas pessoas deveriam entender essas palavras:

"There's no such thing as life without bloodshed. I think the notion that the species can be improved in some way, that everyone could live in harmony, is a really dangerous idea. Those who are afflicted with this notion are the first ones to give up their souls, their freedom. Your desire that it be that way will enslave you and make your life vacuous."

Algo do tipo "Não existe uma coisa tipo vida sem derramamento de sangue. Eu acho que a noção de que as espécies podem de alguma maneira se desenvolver, de que todo mundo poderia viver em harmonia, é uma ideia realmente perigosa. Aqueles que se afligem com essa ideia, são os primeiros a desistir das suas almas, sua liberdade. Seu desejo de que isso seja dessa maneira vai te escravizar e fazer da tua vida uma coisa vaga."

Essa é uma fala de um dos poucos caras que eu admiro no mundo, o escritor Cormac McCarthy, em uma fala para o NY Times, em 1992. Ele é desses caras míticos: velho que nunca aparece.

Me parece mesmo que essa peste humana que é o jornalismo, como um carrapato ou alguma bactéria hospedeira de câncer, continua se sustentando na noção fantasiosa e romântica, que todo ser humano comum têm, de que a vida deve ser de determinada maneira, que existe certo e errado, o bem e o mal, etc. O que constrói esse zum zum zum desgraçado e maniqueísta do nosso cotidiano.

Há ainda outra frase de um livro desse cara para reforçar minha ideia:

"People were always getting ready for tomorrow. I didn’t believe in that. Tomorrow wasn’t getting ready for them. It didn’t even know they were there." 

ou seja:

"As pessoas sempre estiveram se preparando para o amanhã. Eu não acredito nisso. O amanhã não esteve se preparando para elas. Ele sequer sabia que elas estariam lá".

Acho que quando estivermos prontos para o fatal e, assim, destemer o amanhã, a ignorância e as religiões se desmancharão um pouco.